Medicina Tradicional Chinesa e Acupuntura


A acupuntura é uma das muitas modalidades de tratamento incluídas na Medicina Tradicional Chinesa (MTC). Apoia-se em descobertas empíricas e na intuição; não são usados os diagnósticos específicos que se baseiam na patologia de órgãos individuais. Segundo o Dr. Alberto França, a sustentação teórica da MTC é difícil de ser aceita do ponto de vista da medicina biológica.
Na comunidade científica ocidental, a acupuntura foi, até a década de 60, freqüentemente olhada com ceticismo ou até mesmo considerada como charlatanismo e rejeitada por médicos. Uma razão importante para esse ceticismo, que perdura até hoje em menor grau, constitui a limitação ou falta de documentação científica que prove ou refute os efeitos terapêuticos apregoados pelos adeptos da acupuntura. Uma análise da literatura sobre a acupuntura mostra um grande número de publicações, mas sua qualidade é freqüentemente questionável.
Durante as últimas décadas, a acupuntura se tornou cada vez mais popular e parcialmente aceita em muitos países ocidentais, principalmente como técnica de alívio da dor. Vários fatores contribuíram para essa popularidade, tais como o relato de alívio de dor aguda e crônica depois da acupuntura, a compreensão de alguns mecanismos de ação e no interesse nas culturas do Extremo Oriente e em seu misticismo.
Além disso, o tratamento não tem efeitos colaterais quaisquer. O fato mais importante para sua aceitação parcial na área médica foi o acúmulo de resultados da aplicação dos métodos científicos na avaliação de seus efeitos. Isso começou nos anos 50, na China, com estudos da analgesia durante cirurgias. Os relatos sobre cirurgia sob analgesia por acupuntura chegaram ao mundo ocidental no fim dos anos 60. Pessoas que visitaram a China, tanto cientistas, quantos leigos, observaram intervenções cirúrgicas importantes durante a analgesia por acupuntura, mas não puderam acreditar que o efeito analgésico era devido unicamente a essa técnica. Especulou-se que os efeitos analgésicos eram devidos à hipnose, doutrinação ou a medicamentos analgésicos administrados secretamente.
Esse ceticismo é compreensível devido ao conhecimento limitado dos sistemas endógenos inibidores de dor naquela época.
O alívio da dor com métodos psicológicos, tais como a hipnose, estava bem documentado assim como os efeitos dos opiáceos; consequentemente, acreditava-se que tais práticas eram usadas secretamente para se obter o efeito analgésico.
A descrição dos mecanismos da comporta descrita por Melzack e Wall (1965), mostrou que a estimulação somática podia induzir a inibição da dor. Outro fundamento para a compreensão científica da analgesia por acupuntura foi descoberto em 1984.
A liberação de endorfinas para o líquido encefalorraquidiano durante tal técnica e seus efeitos analgésicos explicaram as conclusões chinesas de que tal técnica libera uma substância inibidora da dor, presente no líquido encefalorraquidiano. Quando o líquido cefalorraquidiano de um coelho submetido à acupuntura era transferido para outro coelho não tratado, o animal receptor mostrava uma alteração na sensibilidade à dor semelhante a do animal tratado com a acupuntura.
Agora está bem demonstrado que a acupuntura é uma modalidade terapêutica válida no tratamento da dor. Os mecanismos de alívio da dor podem ser descritos e parcialmente explicados em termos científicos, o que permitiu que a acupuntura fosse integrada à medicina convencional como um método de alívio da dor.
Embora a filosofia da Medicina Tradicional Chinesa, com relação a seus diagnósticos energéticos, pertença à história da medicina, outros aspectos pertinentes às conclusões empíricas podem ser importantes para o desenvolvimento futuro e a prática clínica da acupuntura. Um exemplo é a existência de pontos de acupuntura definidos anatomicamente; pelo menos alguns deles localizam-se próximo de nervos ou em regiões com densa inervação, o que facilita a geração de impulsos nervosos em resposta à estimulação mecânica ou elétrica, ocasionando uma sensação subjetiva (chamada em Chinês de Deqi).
Deveria se notar, entretanto, que a sensação da agulha é verificada em muitas áreas que não a dos pontos tradicionais de acupuntura; desse modo, deveria ser questionada a especificidade desses últimos.
É interessante observar que muitos pontos tradicionalmente selecionados e usados no tratamento de uma determinada doença localizam-se no tecido somático inervado dos mesmos segmentos espinhais que o órgão visceral tido como causador da doença. Em pesquisas posteriores sobre os efeitos da acupuntura, é importante investigar em que medida os pontos selecionados empiricamente têm efeitos específicos.
Os meridianos (canais) não têm contrapartida morfológica nas estruturas periféricas, mas têm uma base funcional em sensações referidas e projetadas que são evocadas pela estimulação de fibras nervosas aferentes.
O conceito de canais pode ainda ser útil enquanto coordenadas anatômicas. A nomenclatura com número de meridianos é comumente usada e internacionalmente aceita. A identificação de uma localização anatômica por seu número de meridiano simplifica a comparação e a avaliação de estudos nos quais a acupuntura foi usada.
O paradigma de acupuntura, segundo a MTC, explica a totalidade das doenças, sua causa e o tratamento. Essa explicação mantém um grande conflito com os conceitos da medicina biológica moderna.
Os estudos dos mecanismos na medicina moderna centraram-se em mecanismos isolados, tais como os transmissores químicos em questão ou os circuitos neuroniais na medula espinhal, mas ainda não se propôs um paradigma que explicasse o mecanismo energético. Se se pudesse entender diferentes aspectos da acupuntura como partes de um princípio geral, tanto a compreensão dos efeitos quanto à pesquisa seriam facilitadas.
Estudos recentes mostraram que a acupuntura e algumas outras formas de estimulação sensorial evocam efeitos semelhantes em seres humanos e outros mamíferos. Sugerem que os impulsos nervosos aferentes gerados ativam os mecanismos de importância fundamental na vida diária, tais como o controle dos sistemas cardiovascular e respiratório, os eixos neuroimunológicos e os sistemas inibidores de dor. Esses sistemas precisam de modificação em seu nível de atividade em situações de estresse e estão implicados com homeostase de células individuais, órgãos individuais e sistemas de órgãos, bem como com o corpo como um todo.
A acupuntura, em algumas situações, produz, em certas funções orgânicas, efeitos similares àqueles que ocorrem durante exercícios musculares de longa duração, tais como uma longa caminhada.
O que é comum ao exercício e à acupuntura, particularmente à eletroacupuntura em estimulação de baixa freqüência, são as contrações musculares que proporcionam descargas rítmicas nas fibras nervosas. Dr. Alberto França explica que muitas funções são modificadas de maneira semelhante nas duas condições e com um curso de tempo semelhante. Com relação a outros aspectos, há claras diferenças, tais como nas alterações metabólicas e nos comandos centrais.

Um comentário:

  1. Prezado Prof. França, gostaria de saber quando haverá uma turma do curso de Medicina Tradicional Chinesa?
    Grata,
    Maria Vitória Barbosa
    mvbarbosa@bol.com.br

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